Ajax resgata atitude cobrada por Cruyff para surpreender na Champions

No dia 20 de setembro de 2010, Johan Cruyff (1940-2016), ídolo do Ajax, usou o espaço de sua coluna no jornal holandês “De Telegraaf” para fazer uma dura crítica ao clube, que havia acabado de ser derrotado pelo Real Madrid por 2 a 0 na fase de grupos da Champions League.

O motivo da crítica não era o resultado, mas a atitude. Segundo ele, que foi jogador e técnico da equipe no passado, aquele estilo de jogo conservador e defensivo não era o modelo que consagrou o Ajax como uma das grandes escolas de futebol da Europa.

“Este não é mais o Ajax”, escreveu Cruyff, que pediu também pelo retorno de antigos ídolos, conhecedores da filosofia da instituição e únicas figuras capazes, na sua visão, de reaproximar o clube de sua cultura futebolística.

Estivesse vivo hoje, certamente ficaria orgulhoso com o estágio atual do time. Nesta terça-feira (30), os holandeses enfrentam o Tottenham, em Londres, no jogo ida da semifinal da Champions.

É a primeira semifinal do torneio que o time disputa em 22 anos. Nesta edição, já deixou para trás o tricampeão Real Madrid e a Juventus de Cristiano Ronaldo.

A construção da equipe que sonha com o título europeu passa pelo resgate da filosofia pedida por Cruyff, a de um clube vitorioso, com atletas formados em casa.

Na partida de volta das quartas de final contra a Juventus, em Turim, o Ajax entrou em campo com atletas cuja média de idade era de 24,7 anos.

Foi a formação mais jovem entre os quatro semifinalistas. Na fase anterior, os escalados por Barcelona (28,1), Liverpool (26,1) e Tottenham (28) tinham média mais alta.

Além de jovem, o time do Ajax foi forjado sob o teto do clube. Sete dos 14 jogadores que participaram da vitória sobre a Juventus saíram das suas categorias de base.

O próprio Tottenham, adversário desta terça, se aproveitou da cultura formadora de talentos dos holandeses. Vertonghen, Alderweireld e Eriksen, titulares de Mauricio Pochettino no time inglês, saíram da base do Ajax.

O zagueiro Davinson Sánchez, 22, também passou por Amsterdã (já como atleta profissional) antes de desembarcar em Londres. A estrutura por trás do que acontece no campo também obedece ao clamor de Cruyff por uma diretoria composta de ex-atletas que dominem a cultura local.

Na direção geral do clube está Edwin Van der Sar, ex-goleiro do Ajax e da seleção holandesa. A direção técnica, que trabalha diretamente com o futebol, fica a cargo de Marc Overmars, ex-atacante companheiro de Van der Sar no título da Champions de 1995/1996 com o Ajax.

No passado recente, também participaram do processo de resgate da filosofia outros ídolos, como Frank de Boer e Dennis Bergkamp, respectivamente técnico e assistente que foram tetracampeões nacionais de 2011 a 2014.

Wim Jonk, ex-jogador do clube nas décadas de 1980 e 1990 e responsável pela base de 2011 a 2015, plantou as sementes do que se vê hoje no time principal, repleto de atletas formados em casa.

O conceito de formar jogadores com o DNA do clube foi muito celebrado pelo Barcelona de Pep Guardiola. Na final da Champions de 2010/2011, 7 dos 11 titulares que venceram o Manchester United eram formados na base catalã, além do próprio treinador.

Curiosamente, aquele Barcelona bebeu da fonte de Johan Cruyff, que foi técnico e mentor não só de Guardiola, mas da filosofia por trás da formação de atletas no Barça.

Hoje, com dificuldade de emplacar jovens da casa na equipe principal, os catalães compram o talento de fora. Como Frenkie de Jong, meio-campista do Ajax e reforço já anunciado pelo Barcelona para a próxima temporada.

Antes da classificação contra a Juventus, a edição espanhola do jornal “El País” abriu espaço para uma coluna escrita por Jordi Cruyff. No texto, publicado antes do confronto em Turim, o filho de Johan falou sobre a reconstrução do Ajax nos últimos anos e como a ideia que seu pai tinha para o clube foi concretizada.

"Muita gente me pergunta se este Ajax é uma homenagem ao meu pai, Johan. Sinceramente, não me atreveria a tanto. O melhor tributo que puderam dar a ele foi batizar com seu nome a Johan Cruyff Arena”, escreveu.

“Mas há, sim, elementos nessa equipe que formavam parte de seu credo futebolístico: estilo, base, juventude, valentia e a gestão nas mãos de ex-jogadores. Estou seguro de que [meu pai] se sentiria orgulhoso dessa geração”, completou Jordi.

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