Quatro dicas para quem deseja investir em uma pequena empresa fechada ou startup

Quem não gostaria de ter sido um dos sócios iniciais de Jeff Bezos, criador em 1994 do site Amazon, ou de Mark Zuckerberg, fundador em 2004 do Facebook, ou de André Street, que lançou em 2014 no Brasil a Stone? É tentador imaginar que, com o investimento de alguns milhares de Reais, você poderia ter a fortuna paga pelo prêmio da Mega Sena deste último sábado de R$290 milhões.

Assim como estes exemplos, outros casos recentes e bem sucedidos de empresas pequenas que se tornaram gigantes, aliada à baixa rentabilidade das taxas de juros, tem despertado a atenção de brasileiros para esta categoria de investimento.

É fácil de ser atraído pelo sucesso de algumas empresas que até pouco tempo não passavam de uma ideia.

Se por um lado esse movimento dos aplicadores é benéfico para o desenvolvimento do país, por outro, o baixo conhecimento financeiro pode levar muitos à decepção ou a prejuízos desproporcionais.

Dentre os muitos aspectos que o investidor deve atentar antes de investir, comento a seguir sobre quatro: remuneração esperada, riscos, forma de investir e como avaliar uma empresa fechada.

Remuneração esperada

Quando se investe em uma empresa, há dois tipos de remuneração a serem recebidas. Um deles é o ganho por dividendo e o outro por valorização das ações.

No entanto, o pagamento de dividendos é raro de ocorrer em startups.

Se você espera obter dividendos nos primeiros cinco a dez anos de investimento, deve procurar empresas maduras que já são negociadas em bolsa de valores.

Empresas pequenas podem até ter lucro, mas este usualmente é reinvestido no próprio negócio como forma de financiar seu crescimento.

Adicionalmente, se você não participa da gestão, corre o risco de não receber dividendo proporcional a sua participação na empresa. Não existe obrigatoriedade de uma empresa fechada distribuir lucros proporcionalmente a divisão de ações no contrato social.

Normalmente, quem investe em empresas pequenas deve ter como principal objetivo vender sua participação em até dez anos para outros investidores que não quiseram correr o risco de investimento no estágio inicial da companhia.

Os sites de equity crowdfunding, mecanismo de investimento em startups, usualmente divulgam o seguinte alerta:

“é mais provável que você perca uma parte ou até todo o seu investimento do que obtenha retorno ou lucro do investimento”.

Pelo fato de entrar no estágio inicial, você pode ter altos ganhos, mas corre muito mais risco. Isto nos leva ao primeiro dos riscos deste investimento.

Riscos

Como mencionado, a maior probabilidade é a de que perderá seu investimento.

É reconhecido o fato de que a maior parte das empresas quebra no estágio inicial. Segundo o Sebrae, uma em quatro empresas fecham em menos de dois anos e quase 50% fracassa em até quatro anos.

Assim como é difícil ganhar na Mega Sena, acertar qual empresa será a próxima Google em dez anos, tem uma baixíssima probabilidade de ocorrência. No entanto, diferente do primeiro, o capital mínimo exigido em aplicações em companhias iniciais é elevado.

A empresa não precisa quebrar para sua participação perder valor. Normalmente, startups precisam de várias rodadas de investimentos. Se os novos aportes forem realizados a preços por ação menores que o adquirido por você, sua cota na empresa pode sistematicamente ser diluída. Portanto, perdendo valor.

No entanto, pior que perder todo ou parte do capital investido, é comprometer o restante de seu patrimônio. Isto mesmo, você pode perder além de seu investimento. A categoria de empresa Limitada (LTDA) pode levar a entender que, no pior caso, você tem perda limitada à sua aplicação, mas não é o que ocorre.

Existem situações em que o patrimônio dos sócios pode vir a ser utilizado para cobrir passivos da empresa. Por exemplo, em dívidas trabalhistas e previdenciárias, quando caracterizada má administração ou ilicitude, e em caso de desvio de finalidade ou uso pessoal dos bens da empresa.

Sobre este último ponto, o advogado e contador Dr. Cicero Wagner Pinheiro Jr, responsável pela CW Assessoria Empresarial LTDA, explica e confidencia a frequência que ocorre:

O Princípio da entidade precisa ser respeitado para que o patrimônio dos sócios não se misture com o da empresa. Há casos em que o sócio usa o carro da empresa para ir a praia ou utiliza o caixa da empresa para pagar despesas pessoais.

Dr. Cícero dá uma solução para mitigar este risco, mas pondera a dificuldade de a colocar em prática:

A implantação de Controles internos e auditoria são necessários, mas que não ocorrem com frequência nas pequenas empresas devido, obviamente, à capacidade financeira.

Entretanto, existe uma forma de investir em startups para que o risco de comprometimento do patrimônio seja mitigado.

Formas de investir

Quando se pensa em investir em uma empresa, nosso primeiro pensamento é por meio da compra de uma participação acionária, entrando no contrato social da empresa.

O advogado Dr. Stenio Gonçalves, sócio da Stenio Gonçalves e Advogados Associados, lembra este fato, mas sugere alternativa mais recente:

“Para investir em uma empresa de capital fechado tínhamos somente uma opção: nos tornarmos sócios. Hoje contudo temos outra opção que é o investimento através da criação de uma Empresa Simples de Crédito (ESC) para a realização de operações de empréstimo, de financiamento e de desconto de títulos de crédito, exclusivamente com recursos próprios, tendo como contrapartes microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte.”

Dr. Gonçalves ainda compara o risco deste novo modelo com o anterior, ressaltando algumas vantagens:

“O risco desse tipo de relação tende a ser muito menor pois existe um vínculo forte entre as pessoas, tão forte que poderia levar a pessoa a ser sócia da empresa para nela investir. A ESC permite que o investimento possua garantias vinculadas e que possa haver inclusive inscrição em cadastros de crédito quanto aos títulos negociados”

Muitas startups e sites de equity crowdfunding, têm usado o mecanismo de dívida conversível para atrair investidores que antes receavam os riscos de perda de seus patrimônios pessoais. Esta dívida pode não ter despesa de juros, mas ter seu ganho atribuído à conversão desta em ações a um preço mais elevado que o valor inicial aplicado. A conversão pode se dar devido, por exemplo, a um evento de troca de controle.

Como avaliar uma empresa fechada?

Fazer uma adequada avaliação da empresa é fundamental para saber se a participação que está adquirindo está a um valor justo ou estaria cara.

Para avaliar uma empresa, comumente, utiliza-se dois enfoques: modelos de fluxo de caixa descontado e de múltiplos. Para a realização destes, é necessário que a empresa tenha registros contábeis confiáveis.

No entanto, como destaca Dr Cícero:

A qualidade da informação Contábil nas pequenas empresas é um grande desafio para os administradores e investidores, na hora de evidenciar a realidade financeira da empresa.

Desta forma, muitas vezes são utilizados múltiplos de preço em relação à receita ou ao  resultado operacional antes de juros, impostos e depreciação (EBITDA). Esse enfoque é similar ao que já utilizamos quando vamos avaliar um imóvel e comparamos o preço/ m2 e  o comparamos com negociações recentes ou outros imóveis a venda na região.

O fato de usar o volume de receita recente (ou do EBITDA) reduz o risco de projeções com elevada incerteza.

Ainda assim, deve ser realizado um estudo profundo na empresa para avaliar seus números, para entender as vantagens competitivas dela, como ela deve elevar suas vendas nos próximos anos e o fluxo de caixa livre desta a valor presente.

Embora no investimento em empresa pequena você esteja mais próximo do dono, tendo eventualmente mais informação, os riscos envolvidos são significativamente maiores que o investimento em bolsa. Portanto, sua aplicação deve ser avaliada com muito cuidado e ser realizada apenas com parcela muito pequena do patrimônio, que possa ser perdida, e com todos os cuidados jurídicos para não comprometer o restante de seus bens com uma falha de seu sócio.

 

Michael Viriato é professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.

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