PF busca contabilidade de propina de até R$ 250 mil por mês no Rodoanel de SP

A Polícia Federal vasculha uma pilha de documentos apreendidos em endereços da empreiteira OAS para tentar comprovar uma contabilidade de propina mensal de até R$ 250 mil que, segundo delatores, era paga pela construtora a agentes públicos do governo paulista encarregados do trecho norte do Rodoanel. 

O pente-fino começou na semana passada, após operação da PF, e visa as chamadas fichas-razão da obra viária de São Paulo, como são chamados os extratos gerenciais que contêm as receitas e despesas da empreiteira e os custos da construção. 

Essas planilhas são apontadas por delatores como prova de que a empreiteira pagava propina mensalmente a funcionários da estatal paulista Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A), responsável pelo projeto durante a gestão Geraldo Alckmin (PSDB).

A investigação de desvios no Rodoanel tem como base as delações de oito ex-executivos que trabalhavam na Controladoria, setor de propinas da empreiteira baiana. Segundo eles, a OAS pagou, de 2013 até os dois primeiros meses de 2014, de R$ 60 mil a R$ 250 mil mensais em suborno para agentes públicos relacionados ao trecho norte da obra. 

Os delatores do setor de propina da empreiteira dizem não saber quem eram os dirigentes da Dersa que recebiam a propina nem qual era a contrapartida para o pagamento. Para isso, segundo eles, é preciso ouvir os diretores da OAS, que ainda não têm delação firmada. 

Nas delações, feitas com a Procuradoria-Geral da República e homologadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em julho do ano passado, os ex-executivos do setor de propina da OAS afirmam que todo mês o departamento gerava os valores do caixa dois e entregava o dinheiro em espécie para dois gerentes da construção, que ficavam encarregados de repassar o suborno a outras pessoas. 

A cada entrega, dizem os ex-executivos, o valor era contabilizado numa ficha-razão no campo dos custos da obra.

A entrega do dinheiro vivo que seria distribuído pelos gerentes da obra, segundo eles, era feita sempre com autorização de Carlos Henrique Lemos, superintendente da OAS para a região Sul e São Paulo. Ele é apontado como uma das pessoas que poderia esclarecer o destino da propina. 

Os delatores também dizem que para gerar o dinheiro da propina do Rodoanel foram forjados contratos com a empresa Legend, do operador Adir Assad, preso na Lava Jato, mas solto desde outubro após celebrar acordo de delação premiada. Assad também é delator e se tornou uma das principais testemunhas dos pagamentos de propina para executivos do Dersa.

A empreiteira, segundo os delatores, também usava contratos falsos com uma empresa chamada Singulare. Nos dois casos, dizem eles, a OAS pagava essas empresas por serviços não prestados —e elas, após emitir notas frias, devolviam o valor em espécie que era usado no pagamento de propina. 

O doleiro Alberto Youssef, pivô da Lava Jato e um dos primeiros delatores da operação, também participou da geração de caixa dois para a empresa e mantinha um esquema de entrega de propinas para agentes públicos, segundo eles. Youssef, afirmaram os delatores, tinha um cartão de entrada da empreiteira para não precisar deixar registro na portaria. 

O Rodoanel é um anel viário que circunda a cidade de São Paulo conectando com as principais rodovias do estado. O objetivo do projeto é diminuir o congestionamento na cidade reduzindo o fluxo de caminhões, além de ter reflexos diminuindo o consumo de combustíveis e emissão de poluentes. 

O projeto inicial do trecho norte do Rodoanel custou R$ 6,5 bilhões e hoje, após atrasos, já consumiu R$ 10 bilhões. Até o momento 83% da obra está concluída e não há previsão de término. A OAS ainda é responsável por parte das obras.

Outras denúncias de corrupção atingiram as obras do Rodoanel. No ano passado, 14 ex-integrantes do governo paulista e da Dersa tornaram-se réus, acusados de participar de um esquema que desviou R$ 625 milhões das obras do trecho norte. 

Houve denúncias relacionadas a outros trechos do anel viário. O ex-presidente da OAS Léo Pinheiro entregou à Justiça do Paraná documentos que indicam o pagamento de R$ 17 milhões em propina nas obras do trecho 5 do Rodoanel Sul.

OUTRO LADO

Em nota, a Dersa diz que a nova gestão estatal “apoia toda e qualquer investigação e vai colaborar de forma integral com o Ministério Público para a elucidação de dúvidas buscando sempre o interesse público”. 

“Desde janeiro deste ano, a Dersa vem buscando aprimorar sua política de compliance, voltado para a ética corporativa pública e a qualidade do trabalho prestado à população.”

A assessoria do antigo governo Alckmin não comentou sobre as suspeitas na estatal até a publicação desta reportagem.

Já a OAS disse que, “por meio de sua nova gestão, tem contribuído com as autoridades competentes e com a Justiça, prestando todos os esclarecimentos”.

O advogado de Adir Assad, Pedro Bueno de Andrade, disse que os assuntos tratados por seu cliente na colaboração premiada são sigilosos e Assad continua prestando todos os esclarecimentos às autoridades.

José Roberto Leal, que defende Carlos Henrique Lemos, se recusou a falar sobre o assunto. 

Alberto Youssef não quis se manifestar.

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