Peça 'Montanha-Russa' fala dos altos e baixos de uma vida marcada pela bipolaridade
“Montanha-Russa” é um espetáculo que fala sobre os altos e baixos de uma vida marcada pela bipolaridade e outros transtornos psiquiátricos.
A carga biográfica presente no texto faz da peça uma espécie de elaboração psicanalítica e memorialista da vida do autor, Marcelo Braga.
É algo que fica ainda mais evidente devido ao caráter narrativo da cena. A estrutura da encenação (assinada por José Eduardo Vendramini) coloca tudo o que acontece sob a perspectiva do filho que cresce com o fantasma da doença do pai.
O público torna-se o silencioso interlocutor desta personagem que é a voz narrativa do autor e dos eventos familiares apresentados. Não vemos exatamente a representação linear de eventos pregressos, mas fragmentos narrados de lembranças remotas.
Com simplicidade e objetividade, as oscilações da vida em família vão sendo apresentadas em torno desse eixo caótico que foi a doença do pai.
Mas o que fica em evidência, na verdade, é processo de elaboração que o autor viveu diante desta penosa especificidade familiar. Entre os arroubos de euforia e os abismos de depressão e agressividade do pai, vemos em cena os tortuosos caminhos do filho para aceitar o quadro e conseguir se desvencilhar do confronto estacionário que não levaria a lugar nenhum. É uma forma sensível de compreender a bipolaridade como doença e não como desvio de caráter.
Em um mundo no qual transtornos dessa ordem se multiplicam, vemos uma cena justa e simples que traça um singelo quadro sobre os impasses de enfrentá-la no dia a dia. Por outro lado, contudo, faz falta algum esforço em ver além da patologia, investigar o objeto para além da própria subjetividade, saltar de si para a sociedade.
A força da análise terapêutica que a peça apresenta carece também de esforço de interpretação social do assunto privado nesta arte pública que é o teatro. O pequeno teatro do Viga Espaço Cênico onde estreou a montagem cria a impressão de que se trata de uma reunião entre familiares e amigos para rememorarem o passado do anfitrião.
Paradoxalmente, contudo, a encenação da peça sublinha no espetáculo a forma narrativa, com interpretações bem objetivas (em especial o trabalho de Juliano Veríssimo), sem afetações líricas da exposição de subjetividades.
De modo que esse caminho estético da montagem demarca o caráter coletivo do trabalho, o ato social de narrar, de contar o passado para outros. É uma espécie de abertura pública dos labirintos privados vividos pelo autor.