O sistema político levou uma rasteira, mas Bolsonaro não é a causa

A velha ordem política de 1988 levou uma rasteira sem precedente, mas Jair Bolsonaro não é causa da debacle. Ele é seu sintoma.

Durante 30 anos, a velha ordem teve a virtude de prover estabilidade política a um país que, antes dela, ignorava o significado do sufrágio universal e dos direitos básicos de uma democracia.

Ocorre que a Nova República trouxe consigo o germe da própria decadência. Afinal, trata-se de um acordo negociado entre as lideranças da abertura e os representantes civis da antiga elite autoritária. O resultado é um pacto que, nessas três décadas de vida, se criou estabilidade, também demandou doses cavalares de patronagem, clientelismo e corrupção.

Isso ocorreu porque a velha ordem terminou preservando boa parte dos vícios oligárquicos do Brasil autoritário: um Estado facilmente capturado por grupos rentistas, leis à venda ao maior pagador, instituições que se dobram perante quem deveriam controlar e parlamentares que prestam pouca conta ao eleitorado. O tamanho da fatura aparece nas estatísticas de educação, saúde, segurança, saneamento básico e produtividade, atestado mais gritante do nosso fracasso.

Apesar de seus problemas, entretanto, a velha ordem parecia ser muito resiliente. Os sinais do declínio só começaram a vir à tona quando uma crise financeira internacional expôs os mecanismos pelos quais o sistema político atenta contra a produtividade de sua própria economia e golpeia as contas públicas da sociedade cujos interesses, em tese, representa. O resultado foi a explosão do desemprego.

Na sequência, um alerta barulhento disparou quando a Lava Jato disseminou informação inédita sobre os métodos que, neste sistema, presidente e parlamento precisam utilizar para construir a maioria governista e gerar caixa de campanha.

Presa a seus vícios, a classe política da velha ordem foi incapaz de identificar a gravidade do problema a tempo de evitar a queda.

Foi o antes inexpressivo Jair Bolsonaro quem conseguiu surfar a onda da revolta popular contra o sistema. Impulsado pelas redes sociais, ele alavancou sua retórica incendiária para energizar cidadãos indignados com a promessa democrática frustrada.

Em seu ataque contra a velha ordem, ele montou o tripé moralista de família, religião e Forças Armadas, as três instituições que ainda gozam de alguma confiança popular. Sem partido e sem máquina, ficou livre para fazer um compromisso estridente com a mudança.

Agora, o drama dele é entregar ao menos uma parte de sua promessa sem sucumbir à troca de favores que é a instituição informal mais básica do velho sistema. Se fracassar em sua tentativa, a onda popular que hoje surfa irá tragá-lo.

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