O cheiro do dinheiro

Segundo Suetônio, quando Tito, o filho de Vespasiano, repreendeu o pai por ter criado um tributo sobre a urina, o imperador colocou uma moeda de ouro diante do nariz do jovem e lhe perguntou se o dinheiro, que fora coletado através da nova taxa, tinha cheiro. Quando Tito disse “não”, César replicou “ainda assim, vem da urina”. A lição de Vespasiano ficou imortalizada na expressão latina “pecunia non olet”, dinheiro não tem cheiro. Mas não tem mesmo?

As Tate Galleries, uma rede de museus do Reino Unido, anunciaram que não vão mais aceitar doações da família Sackler, proprietária do laboratório que produz o analgésico OxyContin, envolvido na crise de opioides.

Um porta-voz das Tate agradeceu aos Sackler pelas contribuições passadas, mas disse que, após consulta a seus comitês de ética, a instituição decidiu não mais aceitar dinheiro “fedorento” (a expressão é minha, e não dos polidos britânicos). Faz sentido isso?

Para o Fisco, não. É unânime a ideia de que os ganhos auferidos em qualquer atividade, moral ou imoral, licíta ou ilícita, devem ser tributados. Deixar de fazê-lo equivaleria a premiar duplamente o crime. O nome por que é conhecido esse princípio tributário é justamente “pecunia non olet”.

Quando, porém, saímos do caixa do Estado para entrar em caixas mais específicos, a coisa pode mudar de figura. Tendemos a rejeitar (ou ao menos regular) contribuições que possam originar conflitos de interesse. É o caso do pesquisador médico que recebe verbas da indústria ou do político que aceita doações de particulares.

O que dizer, porém, de situações em que não há conflito de interesse, mas a origem do dinheiro é moralmente discutível, como é o caso das Tate? Aqui eu adotaria uma posição consequencialista. Se o dinheiro “fedorento” não for para boas causas, irá para as más ou, pelo menos, para as não tão boas. Em qualquer caso, a humanidade perde um pouco.
 

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