Judiciário demorou a medir grau de impunidade agora tratado em pesquisa

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) demorou para encomendar ao seu Departamento de Pesquisas Judiciárias um estudo sobre a impunidade.

A pesquisa “Justiça Criminal: Prescrição e Impunidade” pode permitir uma melhor compreensão dos embaraços à realização da justiça. A conferir.

Ela chega em meio ao debate sobre o combate à corrupção, as distorções do foro especial, a impunidade dos poderosos e a prisão de condenados em segunda instância.

O título sugere um levantamento capaz de avaliar o uso abusivo de recursos procrastinatórios, expediente para alcançar a prescrição [quando é extinta a possibilidade de punição], o que evita o cumprimento das penas —a famosa chicana.

As conclusões do estudo serão submetidas a um imediato teste de qualidade e independência, pois procuradores da Lava Jato acusam o ministro Dias Toffoli, presidente do CNJ, de criar um ambiente favorável à impunidade e à corrupção.

A falta de um diagnóstico sobre a impunidade foi uma cobrança que fiz, em 2017, durante exposição para 300 juízes e membros do colegiado do CNJ, a convite da então presidente Cármen Lúcia.

“Como explicar o fato de o Judiciário registrar índices de produtividade elevados e apenas um terço da população apontar a Justiça entre as instituições em que mais confia?”, questionei.

“Uma vez publicados os relatórios do CNJ, os tribunais cuidam, cada um, de divulgar como foram eficientes no ano anterior. Mas não dissecam um dos efeitos mais nefastos do congestionamento e da morosidade do Judiciário: a impunidade.”

O relatório “Justiça em Números” de 2017 não menciona a palavra “impunidade”.

Dez anos antes, uma pesquisa do Banco Mundial já concluíra que “o sistema judicial brasileiro pode ser criticado por ser dispendioso, ineficiente, lento e pouco eficaz. Mesmo assim, são surpreendentemente altos os níveis de produtividade de alguns tribunais”.

“É possível dizer que a impunidade hoje é maior do que dez anos atrás? Diminuiu? Caberia apurar essa questão em futuros relatórios?” —insisti.

Listei episódios emblemáticos que explicariam boa parte do desgaste do Judiciário.

A seguir, alguns casos mencionados.

Em 2007, ou seja, exatamente dez anos antes do seminário, o ministro Paulo Medina, do Superior Tribunal de Justiça, foi afastado do cargo pelo CNJ, acusado na Operação Furacão de participar de esquema de venda de sentenças para beneficiar empresários de bingos.

Dois anos depois de afastado, Medina presidiu mesa em simpósio no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, sendo muito aplaudido. O processo ainda tramita no TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região).

Outro réu da Operação Furacão, o juiz aposentado José Eduardo Carreira Alvim, do TRF-2, foi preso em 2007 e responde em liberdade.

Carreira Alvim lançou em 2011 um livro com sua versão dos fatos. A obra foi tema de palestras do autor, inclusive para alunos do curso de direito da PUC-SP.

Antes do mensalão e da Lava Jato, o desvio de recursos na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo, revelado em 1998, era o maior escândalo do Judiciário.

O caso foi emblemático diante das chicanas do juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto, do ex-senador Luiz Estevão de Oliveira e dos empresários Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Ferraz.

Em 2014, o plenário do Supremo manteve, por unanimidade, a decisão monocrática de Dias Toffoli que decretara o trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso) numa das ações contra Luiz Estevão, determinando a prisão do ex-senador.

Esses fatos são uma evidência da impunidade. Ou seja, a Justiça não é igual para todos.

Repórter especial, trabalha na Folha desde 1985. Em seu blog, reúne textos investigativos, aborda gastos públicos, política nacional e judiciário.

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