Conheça o papel dos animais na Primeira Guerra Mundial

Eles foram mensageiros, espiões e sentinelas. Lideraram ataques de cavalaria, carregaram suprimentos para o front, reconfortaram soldados feridos e morreram aos milhões na Primeira Guerra Mundial.

Cavalos, mulas, cães, pombos e até um babuíno foram uma parte vital da máquina de guerra das forças aliadas –e sua participação passou décadas sem ser reconhecida.

Pesquisadores têm dificuldade em encontrar relatos oficiais dos serviços prestados por animais durante a Grande Guerra. Mais recentemente, porém, os guerreiros alados e de quatro patas vêm ganhando reconhecimento.

A França decidiu recentemente reconhecer o papel desempenhado por animais na guerra. E em 2004 a Grã-Bretanha instalou um memorial enorme ao lado do Hyde Park, em Londres, “a todos os animais que serviram, sofreram e morreram ao lado das forças britânicas, do Commonwealth e aliadas nas guerras e nos conflitos do século 20”.

Veja como eles contribuíram.

O que eles fizeram

Estimados 10 milhões de cavalos e mulas, 100 mil cães e 200 mil pombos foram alistados no esforço de guerra. A informação é de Eric Baratay, historiador francês especializado na resposta dos animais ao caos, medo e cheiros de morte na missão que os homens lhes impuseram.

A Primeira Guerra Mundial assinalou o início da guerra industrializada, com tanques, caminhões, aviões e metralhadoras em ação. Mas a sofisticação crescente dos instrumentos de morte não se comparava à habilidade de cães encarregados de localizar feridos, dos cavalos e mulas que carregavam munições e alimentos ou dos pombos que atuaram como operadores de telecomunicações ou até mesmo olhos, carregando “pombogramas” ou câmeras minúsculas para registrar as posições alemãs.

“Eles tinham quase a estatura de combatentes”, disse Serge Barcellini, diretor fiscal das Forças Armadas e chefe da associação Le Souvenir Français (A Memória Francesa), em discurso recente dedicado ao papel exercido por animais na guerra.

Tanto assim que máscaras de gás eram acopladas às focinheiras dos guerreiros de quatro patas que enfrentavam vapores tóxicos no campo de batalha.

Cavalos e mulas foram requisitados na França, na Grã-Bretanha e em outros países.

Um cartaz típico pregado em um muro na zona sul de Paris ordenou aos cidadãos que apresentassem seus cavalos e mulas ao Comitê de Requisição até 14 de novembro de 1914, sob pena de ser “processados pela autoridade militar”. Já estava ficando claro que não havia fim rápido em vista para a guerra, que se arrastaria por mais quatro anos.

Heróis alados

Cher Ami, ou Querido Amigo, o pombo-correio que não se rendia, fez jus a seu nome, salvando a vida de 194 soldados americanos do chamado “Batalhão Perdido” da 77ª Divisão de Infantaria, isolado atrás das linhas inimigas durante a ofensiva Meuse-Argonne, no leste da França, em 1918.

Cerca de 550 homens mantiveram sua posição durante dias, resistindo a uma força alemã muito maior, antes de ser alvejados por tropas americanas que não sabiam que os soldados encurralados não eram inimigos.

No dia 4 de outubro o major Charles Whittlesey lançou Cher Ami ao céu com uma mensagem final informando a localização do batalhão americano, seguida de uma súplica: “Pelo menor de Deus, parem com isso”.

Cher Ami perdeu um olho e uma perna nos disparos alemães, mas continuou a voar, percorrendo cerca de 40 quilômetros em meia hora, segundo a Comissão dos EUA para o Centenário da Primeira Guerra Mundial. Os sobreviventes do Batalhão Perdido retornaram às linhas americanas quatro dias mais tarde.

Outro pombo-correio, este chamado Vaillant (Valente), que trabalhou para as forças francesas, também realizou proezas extraordinárias durante a guerra.

No dia 4 de junho de 1916 ele foi lançado ao céu com uma mensagem desesperada: “Ele é meu último pombo”.

Cercado por alemães no Forte de Vaux, perto de Verdun, o comandante francês Sylvain Eugene Raynal contava com Vaillant para salvar seus homens.

O animal corajoso voou em meio a gases tóxicos, chegando ao pombal de Verdun sufocado pela fumaça. Como não chegou ajuda, apesar de seu esforço valente, Raynal e seus homens se renderam três dias depois.

Cher Ami e Vaillant foram honrados com a Cruz de Guerra francesa.

Cavalos e mulas

Cavalos são usados no campo de batalha desde a antiguidade, mas a maioria dos cavalos alistados na Primeira Guerra Mundial não passara por treinamento para a guerra. Os animais morreram aos milhões, de doenças, exaustão e pelo fogo inimigo, obrigando os exércitos francês e britânico a recorrer à América para renovar seu estoque. De acordo com a Comissão Americana de Monumentos de Batalha, uma verdadeira indústria se formou, com mais de meio milhão de cavalos e mulas transportados à Europa por navio até o outono de 2017.

Tão importante foi esse comércio que a ferrovia Santa Fe deu a uma estação ferroviária o nome Drage, em homenagem ao tenente-coronel britânico F.B. Drage, comandante da Comissão Britânica de Montaria, em Lathrop, Missouri, um dos principais pontos de recepção dos futoros animais de guerra.

“Assim, o comércio de cavalos e mulas de guerra é um bom negócio”, dizia um artigo na edição de dezembro de 2015 da “The Santa Fe Magazine”, destinada a funcionários do sistema ferroviário. Bom para o criador, o comprador, o fornecedor e as ferrovias, “mas não para os animais”.

Animais exóticos

Entre os animais mais exóticos convocados a prestar serviço na guerra estava um babuíno chamado Jackie, que serviu com a 1ª Brigada de Infantaria sul-africana no Egito, então sob ocupação britânica, e mais tarde nas trincheiras da França e Bélgica. Sua audição e vista apuradas ajudavam a avisar os soldados de movimento inimigo ou possíveis ataques, o que ele fazia gritando e puxando as roupas dos homens.

Jackie foi ferido nos campos de Flandres quando a brigada sul-africana foi sujeita a fogo pesado de morteiros, em abril de 1918, e foi preciso amputar sua perna.

O tenente-coronel R.N. Woodsend, do Real Corpo Médico britânico, descreveu o procedimento: “Ele tomou o clorofórmio com gosto, como se fosse uísque, e desmaiou em pouquíssimo tempo. A amputação da perna com uma tesoura foi um trabalho simples.”

Cães de guerra

O melhor amigo do homem ajudou soldados a sobreviver na guerra. Inicialmente, cães foram usados para localizar feridos, aprendendo a diferenciar aliados de inimigos. Eles também atuaram como sentinelas, mensageiros, transportadores e caçadores de ratos –uma das pragas das trincheiras, ao lado de pulgas e piolhos. Em dezembro de 1915 as forças francesas criaram uma seção dedicada aos cães de guerra.

Menos oficial, mas crucial para a moral dos soldados, foi o papel desempenhado por cães e outros animais nas trincheiras e como mascotes. Cães vadios que fugiam dos combates foram adotados por soldados como companheiros, além de outros animais, incluindo uma raposa adotada por pilotos britânicos como mascote da Real Força Aérea.

Esses cães e outros mascotes ajudaram os soldados a “pensar na vida... e na vida que esperavam reencontrar”, disse Baratay, o historiador francês, em discurso em Paris no mês passado.

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