Campanhas globais tentam levar jovens para as urnas

Kimberley Kute estava ansiosa para marcar sua cédula na primeira eleição do Zimbábue desde que o exército removeu no ano passado Robert Mugabe, que governou o país por décadas.

“O voto é a sua expressão, sua voz”, diz a gerente de eventos de 24 anos, repetindo as palavras de dezenas de jovens entrevistados nos dias claros e quentes do final de julho, antes da abertura das urnas.

A esperança dos jovens do Zimbábue com a via eleitoral não encontra eco em outros países também sob instabilidade política. Um número crescente dos que se dizem interessados em política rejeita o engajamento formal. Em vez disso, prefere protestos de rua e a organização informal, segundo análise de dados da Orb Media com mais de 979 mil pessoas em 128 países.

Adultos até 40 anos têm de 9% a 17% mais probabilidade de preferir atividades políticas informais do que quem já passou dessa faixa, alta significativa em comparação ao início dos anos 2000, quando a diferença era de 3%.

“Precisamos que uma geração jovem mais participativa apareça, levante a voz e desempenhe papel maior na democracia”, diz Shahrul Saari, 43, presidente interino do Bersih 2.0, observatório da democracia na Malásia.

Jovens sempre votaram em números menores. Mas, enquanto pesquisas mostram que a democracia continua sendo a forma mais desejada de governo, menos deles se engajam como voluntários ou membros de partido.

Existem diferentes razões. Muitos jovens ativistas preferem movimentos horizontais em redes digitais a organizações tradicionais comandadas de cima para baixo. Em alguns países, falta uma batalha ideológica motivadora.

Outro fator é a exclusão pelas estruturas estabelecidas: apenas 2% dos parlamentares do mundo têm menos de 30 anos. A percepção de corrupção também tem seu papel.

A análise da Orb Media descobriu que, em todo o mundo, jovens que acham seu governo corrupto tinham entre 7% e 15% menos probabilidade de votar que colegas que não percebem a corrupção. 

Na Polônia, em 2015, muitos jovens de esquerda “decidiram não votar pelo candidato menos pior e se opor ao sistema em geral”, diz o ativista Dominik Puchala, 20.

Os que votaram favoreceram os partidos da extrema direita. “Votar é uma forma de influenciar algo muito formalmente. Mas às vezes isso não é suficiente”, disse Puchala, enquanto se preparava para participar de manifestação em frente ao Parlamento.

A rua pode ser às vezes um último recurso desesperado. 

Em Bangladesh, estudantes foram atacados por policiais e governistas em agosto, em protestos para para exigir segurança, depois que adolescentes foram mortos por um ônibus em alta velocidade.

“Não planejo protestar, mas não tinha opção”, disse uma estudante de arquitetura de Bangladesh, com os braços enfaixados por causa de uma agressão policial. “Os líderes políticos são todos corruptos. Eles não estão fazendo nada.”

“Eu nunca vou votar. Nosso voto não importa mesmo”, afirmou. Quando os protestos terminaram, em meio a contínuas prisões de estudantes, o governo anunciou um plano de cinco anos para treinar profissionalmente 136 mil motoristas de ônibus.

Nos últimos anos, jovens marchando por justiça política e econômica forçaram a remoção de líderes na Eslováquia, Guatemala, Tunísia e Egito. Em cada país, os grupos no poder se reafirmaram.

“Se os jovens apenas empregarem a desobediência civil, serão inevitavelmente deixados de fora de muitas decisões”, observa estudo recente do Consórcio para Eleições e Fortalecimento de Processos Políticos nos Estados Unidos.

Em outras palavras: você tem que estar envolvido para conseguir o que quer. 

Mas os partidos formais também terão que se adaptar a eleitores atraídos por causas individuais. “Há um problema com as formas mais tradicionais de política”, dize Ben Lake, 25, o segundo mais jovem parlamentar britânico. Ingressar no sistema não é fácil: só 14 dos 650 deputados britânicos têm menos de 30 anos. “As estruturas dos partidos não servem para eles”, diz Lake. 

Na Nicarágua, “eles dizem que, se você não fez parte da revolução de 1979, não tem nada a dizer”, afirma Maria, ativista de 22 anos, enquanto se esconde das forças de segurança que mataram centenas de jovens desde abril.

Maria trabalhou por três anos para engajar jovens em questões cívicas na capital, Manágua. Agora, vive clandestinamente. “A alternativa seria ficar quieta em casa e reclamar entre amigos. Mas temos que nos fazer ouvir.”

“Meus pais e sua geração derrubaram um ditador”, diz outra ativista, Madeleine, 20. “Temos que fazer o mesmo.”

No Zimbábue, os nascidos depois que o governo de minoria branca foi derrubado em 1980 são chamados de “nascidos livres”. “Esse termo indica que, se você não lutou pela libertação do país, então sua opinião não importa”, diz Kute. 

Os nascidos livres cresceram governados por uma elite corrupta e envelhecida, e hoje sofrem com subemprego e desgoverno econômico.

O voto dos jovens “é principalmente com base na raiva e um imenso sofrimento, não com base na educação política”, disse Guta Chengetai, 35, um porta-voz da oposição no Zimbábue.

Mas uma causa instigadora ainda pode cativar. Na Polônia e na Itália, foram as plataformas anti-imigração. 

Em 2015, quando manifestações forçaram o governo da Polônia a bloquear 6.200 requerentes de asilo, “nós realmente sentimos que vencemos”, disse Mateusz Marzoch, 24, porta-voz de um grupo de extrema direita. 

A rua e a internet também não deixam de influenciar a política. Nos EUA, sobreviventes de um massacre que deixou 17 mortos em Parkland (Flórida) criaram um movimento para aumentar o número de eleitores nas eleições parlamentares de novembro.

“Trate cada eleição como se fosse a última que você terá”, tuitou o ativista de Parkland David Hogg, 18, que tem quase 1 milhão de seguidores. Ele pressiona grandes marcas de consumo a cortar os laços com o lobby de armas.

“Se os jovens estão se organizando nas redes sociais, em plataformas digitais ou através de sátira, devemos seguir sua liderança”, disse Rachel Mims, de 30 anos, do Instituto Nacional Democrático nos EUA.

No Brasil, cai proporção de jovens nestas eleições

Entre a única parcela da população brasileira em que o voto é facultativo —a dos jovens entre 16 e 17 anos—, caiu a proporção dos que tiraram o título para votar nas eleições deste ano, em relação ao registrado em 2014.

Há quatro anos, 23,33% desses jovens haviam se interessado em votar. Neste ano, são 21,58%, uma queda de 7,5%. 

Os brasileiros de 16 e 17 anos representam apenas 1,3% do total de eleitores habilitados a votar.

A Orb Media é uma organização jornalística sem fins lucrativos sediada em Washington, nos EUA.  A reportagem original completa pode ser lida no site da organização. 
 

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