Campanha da Nike com polêmico ex-atleta da NFL gera protestos nos EUA

Quando a Nike anunciou na segunda-feira que Colin Kaepernick seria parte de uma grande campanha publicitária, algumas pessoas celebraram. Outras queimaram tênis e rasgaram meias vendidas pela empresa.

Kaepernick, que foi quarterback do San Francisco 49ers, agora está sem contrato na NFL e abriu um processo por conluio contra a organização. Ele ganhou proeminência nacional em 2016, quando começou a se ajoelhar durante a execução do hino dos Estados Unidos, antes das partidas, em protesto contra a desigualdade racial e casos de pessoas negras mortas em ações da polícia. Os críticos o acusaram de desrespeitar o hino e, por extensão, as forças armadas e a bandeira dos Estados Unidos.

Agora, Kaepernick será uma das faces do 30º aniversário da campanha "Just Do It", da Nike. Para exemplificar as reações que se seguiram imediatamente ao anúncio, um membro da dupla country Big & Rich capturou com precisão o sentimento daqueles que se opõem à decisão. John Rich, integrante da dupla, postou uma foto de um par de meias das quais o símbolo da Nike havia sido cortado.

"Nosso técnico de som acaba de cortar a marca da Nike de suas meias", escreveu Rich. "Ex-fuzileiro naval. Prepare-se, Nike: multiplique isso por milhões".

Pela tarde de terça-feira, o tuite havia sido compartilhado mais de 11 mil vezes. Outras pessoas postaram fotos e vídeos de tênis da Nike que pareciam estar pegando fogo, ou terem sido jogados no lixo.

Andrew Morse, que vive perto de Detroit., viu a foto postada por Rich e lembra de ter pesando: "Que coisa mais esquisita de se fazer".

"Se você não quer usá-las, faça alguma coisa com essas meias", disse Morse em entrevista na terça-feira. "Alguém poderia estar vestindo essas meias, em seu lugar".

Depois de ver o tuite de Rich, Morse comprou 30 pares de meias da Nike na Amazon e as enviou à Alternative for Girls, uma organização sem fins lucrativos de Detroit que ajuda mulheres e meninas em risco. Ele postou uma foto de sua compra no Twitter.

Antes do acontecido, Morse, que é dono de uma empresa de ar condicionado em Detroit e opera páginas para torcedores do Detroit Lions no Twitter e no YouTube, disse que não tinha preferência por produtos da Nike, ante outras marcas. Mas isso mudou depois que a companhia anunciou a campanha e ele viu a oposição que ela havia causado online.

"Isso me faz ter orgulho pela Nike, por eles terem decidido agir de acordo com aquilo em que acreditam", disse Morse, 31.

Muita gente expressou sentimentos parecidos online, prometendo comprar produtos da Nike ou exibindo recibos de compras. A Nike também foi elogiada por alguns atletas, entre os quais Eric Reid, um dos primeiros jogadores da NFL a aderir ao protesto de Kaepernick e que agora está sem time e processando a liga; outra atleta a aderir foi Serena Williams, que será parte da nova campanha publicitária ao lado de Kaepernick.

Mesmo John Brennan, antigo diretor da Agência Central de Inteligência (CIA), expressou apoio, tuitando que Kaepernick "atraiu a atenção coletiva do país para o problema da desigualdade racial que continua a existir nos Estados Unidos".

Mas críticos da decisão prometeram boicotar os produtos da Nike e uma campanha #BoycottNike foi iniciada no Twitter. (Não estava claro que dimensões esse boicote poderia ter, e nem se ele está sendo organizado por alguém.)

Muita gente compartilhou uma versão do anúncio da Nike alterada para mostrar o rosto de Pat Tillman, que deixou o Arizona Cardinals, um time da NFL, para se alistar no exército e foi morto em serviço, em 2004 no Afeganistão. (Sua viúva pediu que a maneira pela qual ele é recordado não fosse politizada.)

E algumas pessoas, entre as quais Bill O'Reilly, antigo apresentador da rede de notícias Fox News, criticaram a posição de Kaepernick com relação à polícia, apontando que o jogador havia usado meias que tinham desenhos de porcos com capacetes de polícia.

 

Quando Kaepernick começou seu protesto, em 2016, ele inspirou uma onda de atitudes semelhantes na NFL, em campo e fora dele. A questão ganhou mais peso por ser polarizadora. O presidente Trump usou palavrões para criticar os jogadores que se ajoelham durante o hino nacional, e pediu que os clubes os demitam.

Kaepernick acusou a NFL de conluio para mantê-lo fora de campo por conta de seu ativismo, e conquistou uma vitória quando o mediador que está julgando a questão permitiu que o caso fosse adiante, em uma decisão anunciada na semana passada.

 

Em comunicado divulgado na terça-feira, Jocelyn Moore, porta-voz da NFL, afirmou que "as questões de justiça social que Colin e outros atletas profissionais defendem merecem nossa atenção e ação".

Algumas pessoas reagiram à campanha da Nike com sentimentos contraditórios, e apontaram que a decisão da empresa provavelmente seria boa para seus negócios.

O preço das ações da Nike caiu em mais de 2% na abertura do mercado terça-feira. Embora alguns investidores talvez tenham ficado nervosos com a possibilidade de boicotes inspirados pelo anúncio com Kaepernick, as ações de uma das maiores concorrentes da Nike, a Adidas, também mostravam queda de mais de 2%, em meio a uma baixa mais ampla das bolsas, em parte atribuída a preocupações quanto às negociações tensas sobre o Acordo Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA).

Rosa Clemente, ativista e comentarista política, disse que apoiava Kaepernick mas estava decepcionada por vê-lo trabalhando com a companhia.

"Ativistas, organizadores e líderes às vezes cometem erros, e creio que ele cometeu um erro ao se alinhar com uma empresa que explora os trabalhadores e destrói sindicatos", disse Clemente, 46, em entrevista na terça-feira., "Não é só uma companhia capitalista. É uma companhia hipercapitalista".

David Carter, diretor executivo do Sports Business Institute, na Universidade do Sul da Califórnia, Marshall, disse que a Nike havia tentado se posicionar como empresa que apoia os atletas como indivíduos, e que poderia se beneficiar por manter o ativismo de Kaepernick no ciclo noticioso.

"Creio que isso seja muito coerente com a marca da Nike, e creio que o que existe de diferente no que estamos vendo hoje é que, nessa era de imediatismo, a mídia e os guerreiros dos teclados se posicionaram dos dois lados do caso, para defender seus pontos", disse Carter em entrevista na terça-feira.

A Nike foi criticada na década de 1990 por conta de denúncias de que seus trabalhadores em fábricas no exterior trabalhavam por longas horas e com baixo pagamento, em condições perigosas. Em 1998, a empresa assumiu o compromisso de erradicar as práticas trabalhistas ilegais, mas as críticas e protestos continuaram.

A Nike afirma que não "possui ou opera as instalações em que nossos produtos são fabricados", mas acrescenta que "no entanto, estamos priorizando e cultivando relacionamentos com fornecedores que compartilhem de nosso compromisso de respeitar os direitos humanos e que invistam em suas forças de trabalho".

Este ano, a Nike também precisou lidar com o movimento #MeToo, quando mulheres na sede da companhia em Beaverton, Oregon, apresentaram queixas sobre marginalização e um ambiente de trabalho tóxico, o que resultou na saída de diversos executivos importantes.

Clemente disse que era "fascinante" ver os oponentes de Kaepernick se posicionando contra uma grande empresa como a Nike. "Eles estão seguindo o nosso manual, em seus protestos", ela disse.

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