Boris proporcionará aos populistas o seu tão esperado momento catártico
A “operação topete” foi um sucesso. A imagem de Bolsonaro cortando o cabelo após cancelar uma agenda com um superministro francês correu o mundo.
Os europeus entenderam a mensagem e se preparam para engavetar o acordo com o Mercosul, de modo a preservá-lo da tempestade populista.
A reunião com o secretário de Comércio americano dias depois deixou aparente o objetivo da sabotagem presidencial: colocar o Brasil a postos para o brexit.
Aplicando a receita do confronto permanente com o parlamento, constituindo um gabinete de guerra e armando uma sensacional campanha midiática, Boris Johnson colocou os fanáticos do brexit em ordem de batalha.
Os europeus já avisaram que não aceitarão a renegociação dos termos de saída. O impasse parece definitivo, e a saída radical do Reino Unido em 31 de outubro, inevitável.
Pouco importa se as previsões, que vão de uma década de recessão a uma pura e simples implosão do Estado, são calamitosas. Boris Johnson quer mudar o sentido da história e, ao contrário dos seus homólogos americano e brasileiro, ele tem os meios intelectuais para levar a cabo esse objetivo.
Prova disso, pouco mais de uma semana depois da sua chegada ao poder, o mundo entrou em TPB: tensão pré-brexit.
Bolsonaro e os seus geniais conselheiros acreditam piamente que a aventura do brexit é mais aliciante do que o mercado da União Europeia, com 500 milhões de pessoas.
Para tanto, invocam a boa palavra do vendedor de carros usados Steve Bannon, que sempre apresentou o brexit como o Big Bang de uma nova era comercial.
Na sua realidade paralela, no futuro, a cooperação internacional será livre de restrições ambientais, sanitárias, e desprovida de qualquer resquício de ambição humanista.
Infelizmente a grande união comercial não passa de uma fantasia, por uma simples razão: a aliança americana seria o prego no caixão do Reino Unido.
Escoceses, que sonham em se tornar uma Escandinávia baratinha, preferem a independência ao desmantelamento do que resta do Estado social.
Para os norte-irlandeses, a perspectiva de vassalagem a Donald Trump é tão assustadora que a reunificação da ilha, dividida desde 1920, voltou a ser uma possibilidade.
O risco de embarcar num Titanic não assusta Bolsonaro, que continua investindo todo o seu capital político no alinhamento com os charlatões anglo-saxônicos, na esperança de que as recentes oferendas de Trump, como o acesso aos bastidores da OCDE e da Otan, não sejam migalhas, mas petiscos do que vem pela frente.
Obcecados com fronteiras e as suas ameaças imaginárias, os populistas chegaram ao poder demonizando o outro, seja ele latino, árabe ou africano.
Trump, porém, fracassou em construir um muro na fronteira com o México, Bolsonaro pouco mais do que arranhou a ditadura de Maduro, e Salvini tem sido impedido por corajosos juízes de deixar os refugiados se afogarem no Mediterrâneo.
Com o brexit, Boris proporcionará aos populistas globais o seu tão esperado primeiro momento catártico. Só isso basta para conquistar a adesão cega de todos eles.